Durante muito tempo se acreditou que alunos ingressantes na USP, de classes mais baixas e vindos de escolas públicas fariam com que o nível das universidades caísse. Sou obrigado a admitir que, sem dados para dizer o contrário, eu mesmo acreditei nisso. Mas agora, analisando os dados da própria pró-reitoria de graduação, pode-se dizer o contrário. Esses alunos que entram em universidades públicas, com muito esforço e dedicação estão mantendo e, em alguns casos, até elevando o nível do desempenho acadêmico. Então podemos dizer que os alunos provenientes de escolas públicas e de classe mais baixa sabem dar mais valor à USP do que outros alunos, provenientes de escolas particulares e que no geral não valorizam a universidade por não saberem nem o valor nem o custo dela. Os que vem de escolas públicas são alunos que entram na universidade para estudar e que sabem que um futuro com menos incertezas e com melhoria de vida e do seu padrão sócio-econômico dependem do seu esforço e de seus resultados. No geral, não tem tempo de usar a universidade como playground, como eu já citei em postagens anteriores.*
Toda essa mudança é resultado de uma política de inclusão social realizada pela USP, chamada de INCLUSP. É um serviço que visa diminuir as diferenças sociais no acesso à USP. Funciona a partir de um sistema de acréscimo na nota dos alunos que vêm de escolas públicas que tenham bom desempenho na prova. Na revista eletrônica Território Geográfico vocês poderão encontrar um artigo meu que explica o INCLUSP. **
Vale lembrar que esse programa foi criado como uma forma alternativa de inclusão na USP, que tem posição contrária à política de cotas raciais utilizada por universidades federais. Com esses resultados, se eles continuarem, é claro, poderemos um dia nos orgulhar de ser uma país que dá oportunidade de ensino nas melhores universidades para todas as classes socias. E poderemos começar a falar em justiça quando o ensino fundamental e o ensino médio puderem formar alunos com qualidade o suficiente para ingressar nas melhores universidades sem a necessidade de programas desse tipo. Por incrível que pareça, já foi assim um dia. E não há motivo para acreditar que não pode voltar a ser. Basta que consigamos um pouco de respeito, discutamos os problemas reais e não os imaginários e façamos com que os políticos entendam de uma vez por todas que políticas educacionais só funcionam a longo prazo, então eles devem se preocupar menos com mandatos e sim com políticas públicas. Para isso, precisamos de pessoas bem formadas, com capacidade crítica e possibilidade de formar opinião de acordo com a realidade da periferia, não dos donos do poder. Aí sim poderemos pensar em tirar do poder os aproveitadores que usam o governo para ganhar dinheiro com a ignorância alheia. Pelo menos a USP está no caminho certo, incluindo pessoas em seu quadro discente pelo tipo de escola em que estudou e não pela quantidade de melanina que ela tem na pele. Quando conseguirmos melhorar os ensinos fundamental e médio conseguiremos o tão sonhado aumento da parcela de negros nas universidades, sem que para isso criemos um abismo racial, aumentando assim os conflitos por esse motivo. Talvez então, nesse dia, o povo entenda que os políticos trabalham para ele e não o contrário. Grandes mudanças começam com pequenas atitudes. Espero sinceramente que esse seja o começo de uma grande mudança no país que, por hora, está sem rumo e sob controle de gente que precisa de esfomeados e sedentos para se perpetuar no poder. Senão terei de me contentar com a possibilidade de apenas meus netos terem uma vida um pouco mais decente nesse país.
*Ler "Travestis na USP?", de 21/06/2009, nesse blog.
**Ler "Inclusão em discussão", em www.territoriogeograficoonline.com.br, seção Colunistas - Silvio Villar